Editorial
Nosso novo e esperado colunista inicia conosco com a primeira coluna. Doutor em Letras pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), professor, coordenador do curso de Letras de uma faculdade de Volta Redonda e ainda sobra tempo para ser diretor do Instituto Estadual de Educação Manoel Marinho. É com muita satisfação que estreamos um texto apurado do querido Alexandre Batista.
Seja bem Vindo! Aproveitem…
Atualizado às 00h04min.
Alexandre Batista
A memória é uma das capacidades mais formidáveis do ser humano. Aliás, é umas das capacidades que nos constrói assim. Ela não só está na base do que pensamos como também constitui aquilo que chamamos de sentido. É nela que está, portanto, as cores e as sombras de como percebemos a realidade. Dessa forma, dentro de cada um de nós há um museu de coisas que experimentamos no mundo durante toda vida.
Talvez seja por isso que todos nós sofremos ao ver a história queimando nas chamas que devoraram o Museu Nacional, na Zona Norte do Rio, do meio da noite de domingo (02) à manhã da segunda-feira (03). O acervo de 20 milhões de itens alimentou o fogo que, com línguas violentas apagou, um a um, vestígios de nossa memória de nação em construção. Duro golpe econômico, o incêndio abala a identidade de um país pouco afeito à cultura.

No velório da entidade histórica há muito tempo grave na UTI, as pessoas mais próximas lamentaram sinceramente a perda. Mas é verdade também que muita gente nunca ouviu falar do Museu e só o conheceu a partir do corpo em chamas. E é essa a maior tragédia: segundo informou a BBC News Brasil, o Museu Nacional do Rio de Janeiro registrou, em 2017, 192 mil visitantes enquanto, no mesmo período, 289 mil brasileiros passaram pelo museu Louvre, em Paris, na França. Parece injusta a comparação, mas é muito reveladora, entretanto, de como o brasileiro, independente do governo que temos, valoriza aquilo que é nosso.
As cinzas do museu não conseguem cobrir o nosso remorso de não ter ido mais vezes lá, de não ter lido mais sobre ele. Tentamos conter o espanto da descoberta surpreendente de tudo que queimou. A comoção mundial é devida, mas atrasada. O museu vinha dando sinais de morte há muito tempo e só não tinha acontecido por questão ou por pura ausência de acidentes. Como qualquer indigente, agonizou no silêncio da mídia e da ignorância da população.
Espero que agora a população corra para visitar os outros museus que ainda sobrevivem sabe-se lá como e sob que condições. É o que se pode fazer depois da tragédia para honrar o ancião que partiu nas labaredas gigantes que iluminaram o céu de um domingo triste e que ninguém gostaria de recordar.
Até outro dia. Quem sabe…
